A lagarta-rosca (Agrotis ipsilon) é uma das pragas mais destrutivas das hortas. É um desafio silencioso. Muitos de nós já nos deparamos com plantas jovens cortadas ao nível do solo da noite para o dia, como se tivessem sido ceifadas com uma tesoura. Esse é o sinal clássico da presença desta lagarta, que se esconde durante o dia e ataca durante a noite.
No cultivo biológico caseiro, combater a lagarta-rosca exige conhecimento dos seus hábitos, ciclos e fragilidades, para que possamos adotar medidas naturais e eficazes de prevenção e controlo. Ao longo deste artigo, vamos explorar em detalhe como identificar esta praga, compreender o seu ciclo de vida, conhecer as culturas mais afetadas e, sobretudo, aplicar métodos biológicos e caseiros de combate que respeitem o equilíbrio da horta.
Tópicos neste artigo
O que é a lagarta-rosca
A lagarta-rosca é a forma larvar de uma borboleta nocturna da família Noctuidae. O inseto adulto é uma traça de cor acastanhada a cinzenta, com asas dianteiras escuras e traseiras esbranquiçadas, pouco atraente à primeira vista. Contudo, são as suas larvas que representam verdadeiro perigo para a horta.
As lagartas apresentam uma coloração cinzento-escura ou acastanhada, corpo liso e brilhante, com até 4 a 5 cm de comprimento quando adultas. Uma característica típica é o seu comportamento: quando perturbadas, enrolam-se sobre si mesmas em forma de rosca, daí o nome vulgar.
Esta praga está presente em todo o território português, incluindo Madeira e Açores, adaptando-se facilmente a diferentes condições climáticas. Prefere solos ricos em matéria orgânica, húmidos e mal drenados, o que a torna um problema frequente em hortas bem cuidadas, especialmente no início da primavera e outono, quando a atividade das lagartas é mais intensa.
Hábitos e reprodução da lagarta-rosca
O ciclo de vida da lagarta-rosca é essencial para compreender como controlá-la de forma eficaz.

As borboletas adultas são noturnas e têm o hábito de depositar os ovos em restos de plantas, solos húmidos e zonas com ervas espontâneas. Cada fêmea pode colocar centenas de ovos ao longo da sua vida. Os ovos eclodem geralmente ao fim de 3 a 7 dias, dependendo da temperatura e humidade.
As larvas passam por várias fases de desenvolvimento (instares), sendo nos estádios intermédios e finais que causam maiores danos às culturas. Durante o dia, escondem-se no solo, debaixo de torrões ou restos de vegetação, e à noite emergem para cortar caules tenros ao nível do solo ou ligeiramente abaixo.
Após várias semanas de alimentação, enterram-se no solo para se transformarem em pupas, onde permanecem até emergirem como adultos. Este ciclo pode repetir-se várias vezes ao ano, sendo mais intenso nas estações mais amenas de Portugal continental, Madeira e Açores.
Nas regiões mais quentes, como o Algarve e as ilhas, a praga pode ter várias gerações anuais, enquanto em zonas mais frias, como Trás-os-Montes ou Beira Interior, a sua atividade é mais concentrada nos meses de primavera e outono.
Culturas mais afetadas pela lagarta-rosca
A escolha das culturas cultivadas numa horta influencia diretamente o risco de ataque da lagarta-rosca, já que esta praga tem preferência por determinadas plantas. Embora seja considerada polífaga e possa alimentar-se de muitas espécies, existem hortícolas que sofrem danos mais frequentes e severos.
Em especial, as plantas jovens e recém-transplantadas são as mais suscetíveis, pois os seus caules tenros são facilmente cortados ao nível do solo. Por isso, é fundamental conhecer quais as culturas mais vulneráveis em Portugal, tanto no continente como nas ilhas, de forma a adotar medidas de prevenção e proteção logo desde o início do cultivo.
As culturas mais afetadas em hortas biológicas caseiras em Portugal incluem:
- Hortícolas de folha: alface, couve, espinafre e acelga.
- Solanáceas: tomate, pimento, beringela e batata.
- Leguminosas: feijão e ervilha.
- Cucurbitáceas: abóbora, curgete e melão.
- Plantas aromáticas jovens: manjericão, coentros e salsa.
As plantas em fase de plântula ou recém-transplantadas são as mais vulneráveis, pois os caules tenros são facilmente cortados. É frequente os horticultores encontrarem plantas tombadas logo no dia seguinte ao transplante, o que pode comprometer toda uma sementeira.

Como combater a lagarta-rosca no cultivo caseiro
O controlo biológico da lagarta-rosca não se baseia apenas em eliminar a praga, mas sobretudo em prevenir o seu aparecimento e quebrar o ciclo de vida.
Prevenção e boas práticas culturais
- Rotação de culturas: evita a instalação contínua da praga num mesmo espaço.
- Limpeza da horta: remover restos de cultura e ervas espontâneas, especialmente antes de sementeiras e transplantes.
- Preparação do solo: lavrar e revolver a terra expõe lagartas e pupas a predadores naturais como aves e ouriços.
- Rega controlada: evitar excesso de humidade no solo, que favorece o desenvolvimento da praga.
- Proteção mecânica: usar colares de papel, cartão ou plástico em volta da base das plântulas para impedir o acesso das lagartas.
Controlo biológico natural
- Predadores naturais: aves, ouriços, lagartos e insetos como os carabídeos (besouros de solo) alimentam-se de lagartas. Manter a biodiversidade da horta é fundamental.
- Bacillus thuringiensis (Bt): uma bactéria natural disponível em formulações biológicas comerciais que atua de forma seletiva sobre lagartas. Pode ser aplicada como pulverização, preferindo-se os momentos em que as lagartas estão jovens e mais vulneráveis.
Vigilância e intervenção
- Inspeção regular: observar plantas jovens ao fim do dia ou à noite com lanterna ajuda a detetar a presença ativa das lagartas.
- Recolha manual: nas hortas caseiras, recolher e eliminar lagartas encontradas no solo é uma prática eficaz e imediata.
- Armadilhas de luz: atraem os adultos (traças), reduzindo a postura de ovos. No entanto, devem ser usadas com cuidado para não atrair outros insetos úteis.
Receitas de remédios caseiros biológicos contra a lagarta-rosca
Além das boas práticas, existem soluções caseiras que podem ser preparadas em casa e aplicadas de forma segura.
Chá de absinto
O absinto é uma planta com propriedades repelentes contra várias pragas.
- Ferver 200 g de folhas frescas em 2 litros de água.
- Deixar repousar 24 horas, coar e pulverizar a base das plantas.
Infusão de alho
O alho tem propriedades inseticidas naturais.
- Triturar 5 a 6 dentes de alho e ferver em 1 litro de água.
- Deixar arrefecer, coar e aplicar junto ao colo das plantas afetadas.
Calda de sabão
Útil para reduzir a mobilidade das lagartas quando aplicadas diretamente.
- Diluir 20 g de sabão de potássio em 1 litro de água.
- Pulverizar ao entardecer diretamente sobre o solo e plantas jovens.
Cinza de madeira
As cinzas, além de repelirem lagartas, ajudam a secar o solo superficial.
- Espalhar cinza fina em volta da base das plantas.
- Renovar após regas ou chuvas.
Armadilha com farelo e mel
Uma forma de capturar lagartas ativas.
- Misturar 1 parte de farelo com 1 parte de melaço.
- Distribuir pequenas porções no solo ao entardecer.
- As lagartas são atraídas e podem ser recolhidas manualmente.
Conclusão
A lagarta-rosca é uma das pragas mais comuns e destrutivas das hortas portuguesas, mas pode ser controlada de forma eficaz com práticas biológicas e caseiras. A chave está na prenveção, através da limpeza do solo, da rotação de culturas e do incentivo à biodiversidade, que mantém os predadores naturais ativos.
Quando necessário, podem ser aplicados métodos de controlo direto, como o uso de remédios caseiros simples, como infusões de alho ou cinza de madeira em volta das plantas. A vigilância regular e a recolha manual das lagartas completam esta estratégia, permitindo salvar culturas jovens e reduzir significativamente os danos.
Assim, mesmo em regiões e climas diferentes de Portugal continental, Madeira e Açores, é possível proteger as hortas de forma natural, garantindo colheitas saudáveis e em equilíbrio com a natureza.


























