A Calda Bordalesa é uma das ferramentas mais eficazes na agricultura para o controle de doenças fúngicas e bacterianas. Composta por uma mistura simples, mas poderosa, é utilizada tanto na agricultura convencional como na biológica. Neste artigo, vamos explorar o universo fascinante da Calda Bordalesa. A sua história, os ingredientes, como a preparar, como aplicar e aproveitar ao máximo os benefícios desta poderosa aliada na procura por colheitas mais saudáveis e abundantes.
Tópicos neste artigo
Origem da Calda Bordalesa
Embora seja dito muitas vezes que a calda bordalesa foi descoberta por acaso, não foi exatamente um acaso. Foi o resultado de observações e experiências durante o século XIX na região de Bordeaux, na França, onde os viticultores da região estavam a enfrentar sérios problemas com o míldio, que causava danos significativos às vinhas e prejudicava a produção de vinho.
O botânico Pierre Marie Alexis Millardet desempenhou um papel significativo neste processo. Ele foi convidado a investigar a causa do míldio nas vinhas da região. Durante as suas pesquisas, ele observou que as vinhas próximas a pedreiras de calcário pareciam ser menos afetadas pela doença.
Após várias tentativas e experiências, Millardet descobriu que a combinação de sulfato de cobre, cal virgem e água, criava uma mistura eficaz para controlar o míldio e outras doenças fúngicas nas vinhas. Essa formulação, mais tarde ficaria conhecida como Calda Bordalesa. O seu uso expandiu-se rapidamente para outras regiões vinícolas da Europa e, posteriormente, para todo o mundo. A Calda Bordalesa foi uma das primeiras substâncias utilizadas na agricultura para o controle de doenças e pragas, representando um marco importante no desenvolvimento de métodos de controle de doenças de plantas.
Componentes da Calda Bordalesa
Sulfato de Cobre: Fungicida clássico
O sulfato de cobre é um composto de cobre que tem sido usado há séculos na agricultura devido às suas propriedades fungicidas e bactericidas. É altamente eficaz no controle de uma ampla gama de doenças, incluindo míldio, antracnose, oídio e várias outras infeções fúngicas que afetam as plantas.
Cal Virgem: Estabilizadora e protetora
A cal virgem, também chamada de hidróxido de cálcio ou cal viva, desempenha um papel crucial na formulação da Calda Bordalesa. Além de ajudar a equilibrar o pH da mistura, a cal virgem atua como um estabilizador, reduzindo a fito-toxicidade do sulfato de cobre e melhorando a aderência da calda às plantas. Essa estabilização é essencial para garantir que a calda seja eficaz no controle de doenças, ao mesmo tempo em que minimiza o risco de danos às plantas.

Considerações de Segurança
Embora a Calda Bordalesa seja considerada relativamente segura quando usada corretamente, existem alguns perigos e considerações importantes a serem levados em conta. O sulfato de cobre, em particular, pode ser tóxico para as plantas em concentrações elevadas e representar riscos para a saúde humana e o meio ambiente se não for manuseado adequadamente. Portanto, durante a preparação e aplicação da Calda Bordalesa, é essencial seguir as instruções de segurança e usar os equipamentos de proteção individual recomendados sempre que se trabalha com produtos químicos (óculos, luvas de borracha, latex ou nitrilo e máscara respiratória).
Dosagem dos ingredientes
A dosagem dos ingredientes pode ser expressa em percentagens com base na quantidade de sulfato de cobre e cal virgem em relação ao volume total de água. Por exemplo, para 10 litros de água, 30g de sulfato de cobre e 30g de cal virgem representa uma mistura a 0,3%.
A dosagem adequada varia dependendo do tipo de cultura, estágio de crescimento, condições de cultivo e nível de infestação ou doença. Aqui estão algumas recomendações gerais de dosagem em percentagens para diferentes culturas:
Videiras: Para o controle preventivo de doenças fúngicas como o míldio, recomenda-se uma dosagem de 0,2% a 0,5% de sulfato de cobre e 0,2% a 0,5% de cal virgem em relação ao volume de água. Para o controle curativo de infestações existentes, a dosagem pode ser aumentada para 0,5% a 1% de sulfato de cobre e cal virgem.
Fruteiras: Para o controle de doenças fúngicas como o oídio e a sarna, recomenda-se uma dosagem de 0,3% a 0,5% de sulfato de cobre e cal virgem em relação ao volume de água. A dosagem pode ser ajustada com base na fase de crescimento da cultura e na severidade da infestação.
Hortaliças: Para o controle de doenças fúngicas como o míldio e a podridão apical, recomenda-se uma dosagem de 0,2% a 0,5% de sulfato de cobre e cal virgem em relação ao volume de água. É importante ajustar a dosagem com base na sensibilidade das plantas e nas condições climáticas locais.
Plantas Ornamentais: Para o controle de doenças fúngicas e bacterianas em plantas ornamentais, recomenda-se uma dosagem de 0,2% a 0,5% de sulfato de cobre e cal virgem em relação ao volume de água.
Em todos os exemplos, a dosagem pode ser aumentada para até 1% caso o nível de doença seja severo, mas é importante fazer um teste de sensibilidade numa pequena área antes da aplicação generalizada.
Relação entre os ingredientes
A relação entre sulfato de cobre e cal virgem pode variar dependendo de vários fatores, incluindo o tipo de cultura, a gravidade da infestação ou doença, as condições climáticas etc. No entanto, a proporção mais comum e recomendada é geralmente uma relação de 1:1, o que significa quantidades iguais de sulfato de cobre e cal virgem. No entanto, em algumas situações específicas, como em culturas mais sensíveis ao cobre, pode ser necessário ajustar a proporção. Pede-se optar por uma relação de 1:2, ou seja, o dobro da quantidade de cal virgem em relação ao sulfato de cobre.
Preparação dos ingredientes
A preparação adequada da Calda Bordalesa é fundamental para garantir a sua eficácia no controle de doenças nas plantas. É um processo relativamente simples, mas que requer atenção aos detalhes para obter os melhores resultados. Passos essenciais para preparar a Calda Bordalesa de forma correta:
Pesagem dos ingredientes: Comece por pesar os ingredientes necessários com precisão. Desse modo, vai obter resultados mais consistente e será mais fácil se tiver de fazer ajustes em próximas preparações.
Não use recipientes ou utensílios de metal na preparação da calda. Use recipientes de plástico, vidro ou barro e utensílios de madeira ou plástico.
Preparação do sulfato de cobre: Num recipiente, dissolva o sulfato de cobre em água. Geralmente, dissolve-se o sulfato de cobre (cristais finos) numa pequena quantidade de água morna para facilitar a dissolução e, em seguida, dilui-se com água fria para a quantidade final desejada. Por exemplo, usando a dosagem do exemplo já mencionado, pode dissolver os 30g de sulfato de cobre em meio litro de água morna. Depois, acrescenta o restante da água até completar os 5 litros. Esta mistura pode ser guardada num garrafão de plástico, em local fresco e sem luz solar direta durante vários meses, até um ano, sem perder propriedades.
Preparação da cal virgem: Noutro recipiente, coloque a cal virgem e adicione água mexendo continuamente para evitar a formação de grumos. A quantidade de água depende da quantidade de cal que for usar usando. Por exemplo, para 30g de cal, pode começar com cerca de 1 litro de água e depois acrescentar até completar os 5 litros.
Após adicionar a água, mexa vigorosamente a mistura para garantir uma distribuição uniforme da água e promover a hidratação completa da cal virgem. Continue a mexer até que toda a cal esteja completamente misturada com a água e não haja grumos ou aglomerados. Deixe a mistura descansar por uma a duas horas para permitir a hidratação completa da cal. Após o período de repouso, verifique a consistência da mistura. A cal virgem hidratada deve ter uma consistência cremosa e suave, sem grumos ou partículas sólidas visíveis. Se necessário, agite novamente para garantir uma mistura homogênea.
Em geral, a mistura pode ser armazenada por um período de algumas semanas a vários meses, desde que seja armazenada adequadamente um local fresco e seco, longe da luz solar direta e de fontes de calor. Antes de usar a cal hidratada armazenada por um período prolongado, é sempre uma boa ideia verificar a sua qualidade, garantindo que ela ainda esteja na consistência adequada e sem sinais de deterioração, como mofo ou odores estranhos. Se a cal hidratada estiver comprometida de alguma forma, é melhor preparar uma nova mistura fresca.
Mistura dos ingredientes

Após a dissolução completa do sulfato de cobre e a ativação e descanso da cal virgem, é a hora de preparar a Calda Bordalesa propriamente dita. A sequência recomendada para a mistura dos ingredientes é: misturar o sulfato de cobre na cal virgem. Assim, verta a mistura da cal num recipiente com capacidade para 10 litro no mínimo. De seguida, adicione a mistura de sulfato de cobre tendo o cuidado de deixar cerca de 1 litro para ir adicionando depois quando estiver a corrigir o pH da calda.
A calda não pode ficar demasiado ácida, pois seria tóxica para as plantas, nem demasiado alcalina, pois perderia a eficácia. O pH deve situar-se entre 6,5 a 7, máximo 8. Para medir o pH pode usar a baratas tiras de teste e proceder em conformidade com o resultado obtido. Mergulhe a tira na calda durante três minutos e verifique o resultado. Se estiver abaixo dos 7, adicione mais sulfato de cobre e mexa bem. Deixe descansar 20 a 30 minutos. Repita o procedimento até atingir o pH ideal.

Aplicação da Calda Bordalesa
Como aplicar: A calda deve ser aplicada nas plantas usando um pulverizador. Coe a mistura antes de adicionar ao pulverizador. Pulverize uniformemente sobre as plantas afetadas, cobrindo completamente todas as partes, incluindo a parte inferior das folhas.
Quando aplicar: Geralmente, é recomendável aplicar a Calda Bordalesa durante as primeiras horas da manhã ou no final da tarde, quando as temperaturas estão mais amenas e as condições de umidade são mais favoráveis. Evite aplicar durante as horas mais quentes do dia para reduzir o risco de danos por estresse térmico às plantas. Evite aplicar em dias chuvosos ou ventosos para evitar a dispersão da calda. Repita a aplicação a cada 10-14 dias, conforme necessário.
Preventivo vs. Curativo: Se a aplicação for preventiva, ou seja, destinada a evitar o surgimento de doenças ou pragas, é melhor aplicar a Calda Bordalesa antes do início da estação de crescimento ou antes da temporada de infestação esperada. Se a aplicação for curativa, ou seja, destinada a controlar uma infestação ou doença já presente, aplique assim que os primeiros sinais de problema forem observados.
Plantas em Período de Floração: Evite aplicar a Calda Bordalesa em plantas durante o período de floração, especialmente em culturas polinizadas por insetos, como frutas e vegetais. A pulverização de produtos químicos durante a floração pode interferir na atividade dos polinizadores, como abelhas, prejudicando a produção de frutos. Se for mesmo necessária a aplicação, proteja as flores de alguma forma.
Limpeza e Manutenção de Equipamentos: Após cada aplicação da Calda Bordalesa, limpe cuidadosamente todos os equipamentos de aplicação, como pulverizadores e bicos, para evitar a contaminação cruzada e garantir a eficácia das futuras aplicações.
Onde utilizar a Calda Bordalesa

A Calda Bordalesa é mais eficaz quando aplicada preventivamente ou nos estágios iniciais das infeções. Ela pode ser utilizada em diversas culturas, como videiras, árvores frutíferas, hortaliças e plantas ornamentais. Aqui estão algumas das principais doenças onde a Calda Bordalesa é frequentemente indicada:
Míldio: O míldio é uma doença fúngica comum que afeta várias culturas, incluindo videiras, tomateiros, batateiras e cucurbitáceas. A Calda Bordalesa é eficaz no controle do míldio, ajudando a prevenir o aparecimento de manchas foliares e a reduzir a disseminação da doença.
Ferrugem: A ferrugem é outra doença fúngica que pode causar danos significativos em diversas culturas, como o trigo, o feijão e o café. A aplicação da Calda Bordalesa pode ajudar a controlar a ferrugem, reduzindo a incidência e a severidade dos sintomas.
Antracnose: A antracnose é uma doença causada por fungos do gênero Colletotrichum, que afeta uma ampla variedade de plantas, incluindo frutíferas, hortaliças e plantas ornamentais. A Calda Bordalesa é eficaz no controle da antracnose, ajudando a prevenir a formação de lesões necróticas nas folhas, frutos e hastes.
Podridão das Raízes: Algumas espécies de fungos causam podridão das raízes, afetando culturas como alface, cenoura e diversas árvores frutíferas. A Calda Bordalesa pode ser aplicada para controlar a disseminação desses fungos no solo e proteger as raízes das plantas.
Cancro Bacteriano: O cancro bacteriano é uma doença bacteriana que afeta várias árvores frutíferas, como macieiras, pereiras e pessegueiros. A Calda Bordalesa é eficaz no controle do cancro bacteriano, ajudando a reduzir a disseminação da bactéria e a proteger as árvores contra danos.

A Calda Bordalesa também pode ser utilizada na técnica conhecida como “pintura do tronco”. Essa prática consiste em aplicar a Calda Bordalesa diretamente nos troncos das árvores, principalmente em árvores frutíferas e ornamentais, com o objetivo de protegê-las contra doenças fúngicas, bacterianas e até mesmo pragas.
A Calda Bordalesa pode também ajudar na cicatrização de ferimentos e lesões nos troncos das árvores, causados por podas, danos mecânicos ou ataques de pragas. A calda cria uma barreira protetora que impede a entrada de patógenos e promove a recuperação rápida da planta.